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Silêncio das Inocentes: O Estigma da Periculosidade e a Internação Perpétua de Mulheres Que Cumprem Medida de Segurança no Estado do Pará, O

9 de Abril, 2025 . Teses Flávia Siqueira Corrêa Zell

Esta pesquisa remete de forma crítica às lutas emblemáticas que atravessaram (e atravessam) o campo psiquiátrico no tocante ao tratamento social despendido às mulheres acometidas de sofrimento mental, com enfoque sobre as dialéticas contemporâneas de (não) observância ao princípio da dignidade humana. Para a abordagem histórica, foi considerado o marco da Revolução Francesa como divisor do encargo social que incidiu sobre a loucura na sociedade, já que o período pós-revolução é demarcado pelo culto à razão, pela relação contratual e pela livre circulação de mercadorias, o que caracterizava o louco como incapaz de produzir por não trabalhar. Isso acarretou uma segregação social histórica e a exclusão das pessoas assim caracterizadas do atributo de cidadãs. A curatela dessas pessoas foi, então, chancelada pela figura do psiquiatra. Pode-se associar o surgimento da Medicina Social, difundida por Pinel, com a necessidade de controle do desvio do louco. O isolamento era justificado pela busca da cura. No campo da saúde mental, os movimentos de reforma psiquiátrica foram fortalecidos em virtude do crescimento econômico, reconstrução social, movimentos civis de luta contra as exclusões e preeminência de ideologias libertárias. Dessa forma, fez-se necessário traçar um compêndio histórico acerca da loucura, com especial atenção aos direitos das mulheres consideradas loucas criminosas. Posteriormente, foi associada à loucura o atributo da periculosidade para trazer ao estudo a categoria da louca criminosa. Para isso, apresentou-se uma reflexão sobre o discurso da periculosidade desde a sua origem com a Escola Positiva do Direito Penal até a noção de periculosidade criminal defendida pela Psiquiatria Forense. A metodologia da pesquisa adotada foi a etnografia nos/dos documentos referentes às “loucas criminosas” do estado do Pará, no período de 2007 a 2019, processos que sentenciaram mulheres ao cumprimento de uma medida de segurança na modalidade de internação. Buscou-se conhecer os acionamentos jurídicos, decorrentes das relações entre os saberes médicos e jurídicos, e os agenciamentos dessas mulheres como forma de entender a relação que se estabelece entre o Estado e esta parcela da sociedade. Foi, então, traçado um perfil das “loucas criminosas”, que são, na sua maioria, mulheres jovens, solteiras, pardas, com baixa escolaridade e sem profissão ou com profissões que exigem baixa qualificação. Ademais, elas cometeram predominantemente crimes contra a pessoa e possuem transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool e outras drogas. Sobre essas mulheres concluiu-se que permanece a incidência do discurso da periculosidade que as estigmatiza e justifica a permanência delas em instituições fechadas para o “tratamento” de suas doenças mentais, que na prática são verdadeiras prisões. A finalidade última deste trabalho é possibilitar que haja uma reflexão sobre a dificuldade de se firmar os direitos sociais em uma sociedade excludente, na qual as mulheres, particularmente aquelas tidas como loucas infratoras, têm seus direitos violados, e contribuir, assim, para a efetivação de mudanças nesse cenário.

Autor(a)

Flávia Siqueira Corrêa Zell

Orientador(a)

Érica Quinaglia Silva

Curso

Antropologia

Instituição

UFPA

Ano

2021