As narrativas dos meios de comunicação são, muitas vezes, apresentadas como a única realidade daquilo que está sendo noticiado, o que costuma contribuir bastante para formar a percepção da audiência acerca de um determinado assunto. É levando isso em conta que o presente trabalho objetiva analisar como tal processo apresenta-se em uma produção local cujo tema gira em torno do Pará e/ou de um projeto identitário pautado na ideia de um “ser paraense”, visando compreender os mecanismos que operam na correspondência entre mídia e audiência, ou melhor, de como os conteúdos midiáticos tocam a dimensão inconsciente dos espectadores. Para tanto, adotou como objeto privilegiado de estudo, o programa regional intitulado É do Pará, apresentado pela TV Liberal, filiada à Rede Globo de Televisão. Em termos metodológicos, a pesquisa dividiu-se em dois momentos complementares: uma etapa empírica e outra voltada a estudos de natureza teórica. No caso da primeira, esta se deu a partir de um acompanhamento regular do programa, bem como da posterior seleção de episódios que estavam disponíveis no site G1 Pará. Assim, ao considerar os limites da presente pesquisa, foram separados somente os 15 episódios do segundo semestre de 2019 que traziam o programa na íntegra. Estes foram sistematicamente apreciados e descritos, isto é, transformados em texto. Em seguida, foi realizada a análise dos dados segundo o que preconiza o método psicanalítico freudiano. Destarte, escuta e transferência foram os instrumentos principais para o tratamento das descrições, que resultou na elaboração do texto metapsicológico do terceiro capítulo. Esse procedimento teve o suporte da fundamentação dos estudos teóricos à luz de elementos da psicossociologia freudiana apresentada no livro Psicologia das massas e análise do Eu, movimento esse voltado para uma tentativa de compreensão de como as matérias atingem as massas engendradas pelo programa. Essa segunda etapa foi complementada por uma revisão bibliográfica em outros trabalhos de Freud, tais como: Introdução ao narcisismo, Luto e melancolia e O Eu e o Id, dos quais foram retiradas ferramentas teóricas como as noções de “narcisismo”, “identificação” e “ideal do Eu”. Sendo assim, ressalta-se que a audiência do É do Pará é mobilizada por um “tecnonarcisismo”, pois procura no programa um ideal de si, o qual foi constituído pela relação com as figuras parentais. Com isso, as idealizações do programa ocupam o papel paternal de “líder” das massas que engendram. Nesse sentido, questiona-se o interesse econômico e político no exclusivismo de uma identidade midiática ideológica, de um “Eu sou” imaginário, que estabelece um padrão do que seria ou não “ser paraense” para os componentes de suas massas. Em termos conclusivos, o “interditar a si” definido por tal padrão parece produzir um mal-estar que sempre retorna na autocobrança de estar ou não enquadrado no checklist midiático. Ou ainda na inquietação do conviver com esse outro “estranho familiar”, o desejante “não paraense”. A despeito de qualquer exclusivismo, nem todos os paraenses fazem parte das massas do É do Pará, pois nem mesmo são seus telespectadores e não têm suas vidas assentadas em sua ideologia.
Eu Sou “É do Pará”: Psicologia das Massas e Análise de um Programa Televisivo
Ciro Cesar da Silva Lopes
Orientador(a)
Maurício Rodrigues de Souza
Curso
Psicologia
Instituição
UFPA
Ano
2020