Na segunda metade do século XIX, algumas províncias do Norte do Império brasileiro enfrentaram sucessivas secas, que provocaram a migração da população residente nas áreas atingidas para outras onde se acreditava existirem recursos que possibilitariam a sobrevivência. No ano de 1877, iniciou-se uma seca no Ceará que se estendeu até 1879. No final da década de 1880, o fenômeno mais uma vez visitou as terras cearenses, deixando suas marcas visíveis, principalmente em 1888 e 1889. Nesses dois momentos, grande foi o deslocamento de homens e mulheres cearenses para outras províncias brasileiras, entre elas, a vizinha, Piauí, que em certa medida também já era afetada pela seca na forma de fenômeno climático, passando a experimentá-la também como produto social. O objetivo desta tese é analisar a migração de cearenses para o Piauí, entre os anos de 1877 e 1891, considerando esses deslocamentos um ato de protagonismo de homens e mulheres, pobres e ricos que empreenderam as jornadas migratórias como possibilidade de vencer as dificuldades impostas pela seca em seu local de origem, elegendo o Piauí como rota e também destino. Toma-se como base para o recorte de tempo, o ano em que o fluxo de cearenses passou a ser mais intenso em direção à província vizinha, até o início da década de 1890, quando ainda eram realizadas as práticas assistencialistas por meio dos socorros públicos, e já era possível encontrar cearenses constituindo novas famílias no Piauí. Entre as fontes definidas para a realização da pesquisa, estão os diferentes jornais editados no Piauí e no Ceará, além de relatórios, mensagens, discursos, atas, bem como ofícios e outros documentos da Comissão de Socorros Públicos. Com isso, na presente tese investiga-se o fato de que, para além dos fluxos migratórios ocorridos no Oitocentos, já conhecidos na historiografia, existiram outros destinos migrantes empreendidos pelos cearenses, entre eles o Piauí, que também foi afetado pelas secas, visto como um polo receptor, seja daqueles que a essa região se destinavam, à medida que ela oferecia melhores condições de sobrevivência que o Ceará, ou dos que estavam tentando uma travessia para o Maranhão e o Pará. Por ser intensa em muitas épocas, a migração trouxe para o Piauí o agravamento das consequências da seca, exigindo medidas de combate aos seus efeitos pelo governo local, que instituiu as Comissões de Socorros Públicos, promovendo o assistencialismo e deslocando parte dos migrantes para as frentes de trabalho, seja em obras públicas ou nos Núcleos Coloniais. Ao chegarem ao Piauí, os migrantes quase sempre encontravam dificuldades para sobreviver, porém, muitos conseguiram se estabelecer nessa região e não voltavam para o Ceará após o fim da seca. Desse modo, defende-se a tese da importância do Piauí nos contextos migratórios do século XIX, como um espaço receptor de migrantes cearenses e gerador de múltiplas experiências sociais
Emigrados do Sertão: Secas e Deslocamentos Populacionais Ceará-Piauí (1877-1891)
Márcio Douglas de Carvalho e Silva
Orientador(a)
Franciane Gama Lacerda
Curso
História
Instituição
UFPA
Ano
2023